Educar Meninos Não é Frescura!
REFLEXÕES SOBRE GÊNERO PARA FAMÍLIAS E EDUCADORES
Marina Speranza
Este é um livro leve, curto e potente sobre a educação de meninos, focado em mães, pais e educadores. Com linguagem bastante informal, como se fosse uma conversa, traz experiências pessoais e propõe reflexões para repensar o tema da educação dos meninos. Não sem antes passar por uma boa conceituação sobre gênero e socialização masculina baseada nos estudos de autores como Raewyn Connell e Pierre Bourdieu, só para citar alguns. Escrito por Marina Speranza, mestre em gênero, que tem uma visão cultural ampliada pelo fato de ser brasileira e morar em Barcelona. Além, claro, de ser mãe de um menino de 12 anos. O grande diferencial do livro é que foi escrito no momento em que vivemos, com pais querendo educar meninos para as mudanças do mundo, mas com dificuldade de lidar com antigos tabus.
Quando descobri que estava grávida de um menino, apavorei. Tentei um livro famosinho sobre como educar meninos, mas rasguei antes de jogar fora, pra ninguém correr o risco de ler aquela baboseira sobre hormônios. Meu filho nasceu, um ser frágil, sensível, nada a ver com o guri que abusou de mim ou o familiar que abusou da minha mãe.
Simone de Beauvoir dizia que não se nasce mulher, se torna. O mesmo se pode dizer dos homens, é um conjunto de vivências que nos faz ser quem a gente é. E nossa criação tem tudo a ver com o que temos entre as pernas. Em geral, mulheres aprendem que devem casar e ter filhos, homens que precisam ser eficazes, especialmente no trabalho e na cama, e, para conseguir, vale usar violência.
Só que, ultimamente, as mulheres começaram a questionar, denunciar abusos, ver que tem muita coisa errada aí, e chega de sermos cúmplices. Surgiram livros, sites, perfis, tudo ensinando como criar feministas, e as meninas estão aprendendo que podem TUDO e não precisam ficar esperando o príncipe encantado. #Primeiroassedio, #nemumaamenos, #lutecomoumagarota, e de repente as mulheres estão juntas em podcasts, dirigindo filmes, até na final do Big Brother. O mundo mudou, está mudando, a uma velocidade que nenhuma Ferrari consegue alcançar.
Não vive neste mundo quem não reparou a onda rosa dos últimos dois meses. Mas se Barbie foi poderosa e conquistou muita gente que revirava os olhos, foi o Ken que mais gerou discussões na mídia e nas redes sociais. O slogan do filme diz muito: “Ela é tudo, ele é só o Ken”. Perguntei pra uma menina: o que você achou do Ken no filme? Um tanto inseguro. Mais no começo ou no fim? Os dois.
Como os meninos estão vivendo todas essas mudanças? Já pensou em quantas mensagens contraditórias estão recebendo, o tempo todo? Alguns pensam em tomar a pílula vermelha, outros acham que vão arrasar só vestindo uma saia. De um lado meninas querendo compartilhar um mundo mais justo, de outro alguém berrando: deixa de ser frouxo.
Como meninos e meninas vão namorar um dia, quando elas veem comédia romântica e eles pornografia? E o que os guris vão fazer quando se derem conta que elas não precisam de super-heróis? Vão dar um empurrão e partir pra porrada, como fazem no parquinho? Como vão olhar pro que sentem, se aprenderam que não podem chorar e continuam escutando: se apanhar, se defenda?
E o que a gente faz quando tem filho homem e sabe que eles vão ser rejeitados pelos iguais se não fizerem parte do clubinho? O que dizemos quando nosso filho encasqueta de sair com uma bolsa vermelha? E quando o filho da amiga quer pintar a unha e se divertir com a mãe? A gente deixa, mas dá aquele medinho. Tem aqueles que levam na boa, mas sempre que possível, lembram que o filho (no alto dos seus 7 anos!) tem namorada, lógico. Tá vendo o problemão, logo ali na frente?
Hoje, começamos a nos dar conta que a socialização dos meninos não favorece as mulheres, mas também não é tão benéfica aos meninos, futuros homens. São eles os campeões em violências contra si mesmos, o que é fácil de se comprovar com as altas taxas de suicídios e mortes por acidentes entre os homens, especialmente os mais jovens. Neste contexto, surge a necessidade de refletir sobre as masculinidades, e, mais especificamente, sobre a educação dos meninos.
Certamente vem mais filmes da Barbie por aí, e, com eles, a discussão sobre masculinidades vai seguir a mil. Está para ser concluída também uma grande pesquisa sobre os sonhos dos meninos brasileiros, que vai gerar um documentário. O assunto é urgente e necessário, e não é à toa que tem apoio da ONU e a Natura está patrocinando. Isso depois de a Gilette entrar no tema com força.
Pais, mães, tios, avós, todo mundo está um tanto perdido, educadores precisam de alternativas, de reflexões. E é esta a proposta do livro: abrir o diálogo, trazer estudos sobre gênero, masculinidades e ter uma boa conversa sobre a socialização dos meninos. Eu explico um pouco sobre relações de gênero, sobre masculinidades, conto como funcionam os processos de socialização dos meninos, falo sobre emoções e sentimentos, homofobia, violência, paternidade, e na segunda parte do livro conversamos sobre propostas para acolher os meninos e criar um mundo com mais igualdade de direitos e respeito às diversidades.
Em um segundo projeto, penso que seria interessante focar nos meninos, com um livro muito didático e ilustrado sobre emoções, sentimentos, mudanças corporais na adolescência, diversidades, espermaquia, prevenção de DSTs, a relação com a pornografia e diversas dúvidas que surgem entre os 8 e os 14 anos. Uma atualização do livro Aparelho sexual e cia, com questões da nossa realidade brasileira hoje e ilustrações do artista Viti Grosman.